Fator Reumatoide: Diagnóstico da Artrite Reumatoide

Descubra o que é o fator reumatoide (FR), um autoanticorpo crucial para o diagnóstico da artrite reumatoide (AR). Neste artigo, exploramos aspectos laboratoriais, testes e interpretação dos resultados relacionados a essa condição autoimune inflamatória.

ANÁLISES CLÍNICASIMUNOLOGIA

Dr. Marconi Rego

3/1/20255 min read

O que é o Fator Reumatóide?

O fator reumatóide (FR) é um autoanticorpo IgM anti-IgG produzido pelos linfócitos B. É  detectado em cerca de 70-80% dos indivíduos com artrite reumatóide (AR), não sendo exclusivo para os portadores desta patologia. Sua presença no sangue é um indicativo importante para o diagnóstico e rastreamento desta condição autoimune. O FR atende à necessidade de um marcador que não apenas auxilia na identificação da AR, mas também proporciona informações valiosas sobre a gravidade da doença e a resposta ao tratamento.

A Artrite Reumatóide

A artrite reumatóide é uma doença autoimune crônica em que ocorre uma ataque do sistema imunológico às membranas sinoviais, o que forma o pannus sinovial, um tecido inflamatório anormal. Esse tecido consiste em uma proliferação descontrolada de células inflamatórias, fibroblastos e vasos sanguíneos, que gradualmente invadem e destroem a cartilagem e o osso subjacente a medida que o processo inflamatório avança. A inflamação é mediada por citocinas sintetizadas pelas células Th1 e, potencialmente, também pelas células Th17. A ativação destas células levará a ativação dos macrófagos, que produzem citocinas pró-inflamatórias, como IL-1, IL-6, IL-17 e TNF-a. Os fibroblastos ativados produzem metaloproteinases (MMPs) que destroem o tecido. O fator RANK, por sua vez, produzido por estas células e pelas células T, ativam os osteoclastos, células que destroem tecidos. Além disso, anticorpos contra várias proteínas na articulação são produzidos, contribuindo para todo o processo. A figura 01 abaixo resume as etapas do processo inflamatório que ocorre na artrite reumatóide.

Figura 01. Patogênese da AR, etapas do processo inflamatório. Fonte: Murphy.

Alguns fatores estão envolvidos na patogênese da AR como os:

a) genéticos: mutações no lócus, nos alelos HLA-DR4 e HLA-DR1;

b) ambientais: infecções, tabagismo, desequilíbrios hormonais;

c) imunológicos: produção de autoanticorpos como o FR e o anti-CCP (mais específico).

Aspectos Laboratoriais do Fator Reumatóide

Os testes laboratoriais para a detecção do fator reumatóide incluem principalmente os testes de aglutinação passiva e o ensaio imunoenzimático. Os testes de aglutinação são frequentemente utilizados por serem simples e de baixo custo, mas podem apresentar limitações em indivíduos com níveis baixos de FR. O ensaio imunoenzimático é mais sensível e específico, permitindo a quantificação dos anticorpos presentes no soro do paciente. Veja os testes descritos abaixo:

Teste de Aglutinação Passiva (Waaler-Rose e Teste de Látex)

  • Reação de Waaler-Rose: Utiliza hemácias de carneiro sensibilizadas com IgG de coelho. Se houver FR presente no soro do paciente, ocorre aglutinação visível.

  • Teste de Látex: O princípio do ensaio é semelhante ao da reação de Waaler-Rose, já que se baseia também na aglutinação passiva para detecção do autoanticorpo. No caso do teste de látex, partículas de látex estão revestidas com IgG humana. É um teste mais rápido e sensível. Uma comparação entre os dois ensaios pode ser vista no quadro a seguir.

Fonte: Própria.

Teste de Imunoturbidimetria e ELISA

  • Imunoturbidimetria: Mede a turbidez causada pela reação entre FR e IgG padronizada em meio líquido.

  • ELISA (Enzyme-Linked Immunosorbent Assay): Detecta diferentes isotipos de FR (IgM, IgA e IgG) e apresenta maior especificidade.

A interpretação dos resultados laboratoriais é crucial. Um resultado positivo para o fator reumatóide não confirma isoladamente o diagnóstico de artrite reumatóide, uma vez que o FR pode ser encontrado em outras condições autoimunes e até mesmo em indivíduos saudáveis. O resultado negativo também não exclui possível doença autoimune como a artrite reumatóide. Portanto, o contexto clínico do paciente deve ser considerado juntamente com os resultados dos testes. No quadro a seguir você pode visualizar os valores de referência quantitativamente e a interpretação clínica para cada resultado.

Fonte: Própria

Outras doenças relacionadas à positividade do FR:

  • Lupus Eritematoso Sistêmico (LES)

  • Sjögren

  • Hepatites virais crônicas

  • Tuberculose

Para aumentar a especificidade no diagnóstico da AR, o anticorpo antipeptídeo citrulinado cíclico (anti-CCP) é frequentemente solicitado junto ao FR.

Interpretação Clínica do Fator Reumatóide

O FR não é exclusivo da artrite reumatóide. Este autoanticorpo também é detectado em outras condições como no lupus eritematoso sistêmico (LES),

Nos pacientes com sintomas sugestivos de artrite reumatóide, como dor nas articulações, inchaço e rigidez (figura 02), a presença do fator reumatóide é um indicativo que fortalece a hipótese diagnóstica. Estudos sugerem que um resultado positivo para o fator reumatóide pode estar associado a um curso mais agressivo da doença, levando a uma maior necessidade de intervenções terapêuticas.

Além disso, a monitorização contínua dos níveis de FR pode fornecer insights importantes sobre a eficácia do tratamento. Uma redução nos níveis pode indicar uma resposta favorável à terapia, enquanto níveis persistentes ou elevados podem sugerir a necessidade de ajustes no plano de tratamento.

É importante ressaltar que, apesar de seu papel significativo, o fator reumatóide é apenas uma parte do quadro clínico total. Uma avaliação abrangente pelo reumatologista, incluindo exames físicos e outros testes laboratoriais, é fundamental para chegar a um diagnóstico preciso e um planejamento terapêutico eficaz.

Conclusão

O Fator Reumatoide é um importante marcador laboratorial para o rastreamento da Artrite Reumatoide, mas sua presença isolada não é diagnóstica. A combinação do FR com exames complementares, como anti-CCP e marcadores inflamatórios (PCR, VHS), melhora a precisão do diagnóstico.

Se necessário, exames de imagem, como ultrassonografia articular e ressonância magnética, podem ser usados para avaliar a extensão do dano articular.

Referências:

  • Murphy, K. Imunologia de Janeway, 8ª edição.

  • Robbins. Patologia Básica, 9ª edição.

O fator reumatóide é uma ferramenta laboratorial valiosa no rastreamento da artrite reumatóide, permitindo aos médicos não apenas diagnosticar a condição, mas também monitorar seu progresso. A interpretação cuidadosa dos resultados laboratoriais, em conjunto com a avaliação clínica, é essencial para a gestão eficaz da artrite reumatóide. A presença do FR deve ser interpretada com cautela, pois pode estar presente em outras condições além da AR.

Figura 02. Articulações das mãos na AR.